No capítulo 40,
começam as profecias que se referem ao exílio e pós--exílio. Isaías tem
objetivos muito claros nessa segunda parte de suas profecias. Ele anuncia ao
povo que o tempo de sofrimento estaria chegando ao fim, que o castigo divino
estava para terminar e que bênçãos e salvação estavam a caminho. Elas enfatizam
o livramento (40-48), a redenção (49-57) e a glória (58-66) do povo de Deus.
Logo, dizem respeito à salvação e à esperança, servindo de contrapeso às
profecias iniciais que previam catástrofes e miséria devido à desobediência do
povo, mostrando também que a misericórdia e o amor de Deus são infinitamente
maiores que sua correção e juízo.
As profecias se
referem a dois períodos históricos. O primeiro é o do cativeiro babilónico que
logo aconteceria e o povo precisaria ter esperança em Deus para ver Jerusalém e
o templo completamente destruídos (veja Lamentações de Jeremias) e sobreviver
em Babilónia, um lugar de sofrimentos, saudades (SI 137) e perdas; alguns deles
serviriam no palácio real, como Daniel e seus amigos, porém muitos seriam
escravos maltratados e fariam trabalhos desprezíveis. Aliás, os maltratados
eram maioria. Por isso, o profeta anima-os com suas palavras preparando-lhes
para este tempo; o segundo é o período em que eles voltariam do cativeiro e,
dadas as condições precárias da longa viagem, em boa parte pelo deserto, bem
como a própria situação de Jerusalém devastada, a qual encontrariam quando
chegassem, era preciso palavras de encorajamento para que o remanescente não
desfalecesse. Todas essas profecias de Isaías, no entanto, têm um horizonte
muito maior, que é a salvação que Deus daria ao povo através de Cristo; por
isso, o profeta é chamado de anunciador de Boas-Novas, pois ele prevê que Deus
traria grande salvação ao seu povo, para além do tempo de cativeiro e retomo.
I - O PROFETA EVANGELISTA
A destruição
estava em toda parte (Lm 2.2), o templo foi profanado, e todos foram humilhados
(Lm 1.10; 2.15; 3.45-46), a autoestima foi abalada (Lm 2.1), a esperança
esvaiu-se por completo (Lm 5.2), o povo foi levado escravo (Lm 1.3; 5.5),
instalou-se uma crise de identidade (Lm 1.6; 2.9; 5.6) e a fome devorava todos
(Lm 4.4-5). É nesse contexto futuro de destruição que o profeta constrói uma
das passagens mais lindas de Isaías. Primeiramente que Deus agiria trazendo
libertação ao povo, mas também traria a certeza de que o Messias viria como
ungido divino e restauraria todas as coisas.
É importante
notar uma inferência à trindade no texto do capítulo 61, pois o profeta se
refere ao “Espírito”, ao “Senhor Jeová” e a “mim” (Is 61.1), demonstrando que
toda a trindade e poder divinos estavam agindo a favor de Israel e da
humanidade perdida, no sentido de lhes trazer salvação e redenção completas
através das Boas-Novas do evangelho. Teologias do método histórico-crítico
argumentam que, quando o profeta se refere a “mim”, está se referindo a si
mesmo ou ao povo de Israel, porém essa tese é desfeita quando Jesus toma o
livro de Isaías na sinagoga de Nazaré e diz: “Hoje se cumpriu esta Escritura em
vossos ouvidos” (Lc 4.21)
1. A situação do povo no cativeiro
Aconteceram
três deportações para a Babilónia; a primeira em 605 a.C., sendo um dos cativos
o profeta Daniel; a segunda em 597 a.C., quando foram levados todos os nobres e
ricos da cidade, em tomo de 10 mil pessoas; e a terceira, como um golpe final
sobre Jerusalém, aconteceu no ano 586 a.C.. Alguns haviam morrido de forme e
nas guerras, e somente os mais pobres dentre o povo ficaram na cidade. Nessa
conquista, a cidade foi devastada, o templo queimado e as riquezas saqueadas.
Somente no ano de 539 a.C. os judeus começaram a voltar para Jerusalém e a
reconstruí-la juntamente com o templo.
O povo de Deus,
vivendo fora de sua própria terra, estaria numa situação muito lastimável. Eram
escravos, sem templo, sem sacerdote, sem rei, sem orientação clara, em total
desespero. Isaías nos dá uma ideia de como seria: “Essas duas coisas te
aconteceram; quem terá compaixão de ti? A assolação, e o quebrantamento, e a
fome, e a espada! Como te consolarei? Já os teus filhos desmaiaram, jazem nas
entradas de todos os caminhos, como o antílope na rede; cheios estão do furor
do Senhor e da repreensão do teu Deus” (Is 51.19-20). Eles seriam tão
humilhados que o profeta lhes chama de “bichinho [outras versões escrevem
vermezinho] de Jacó, povozinho de Israel” (Is 41.14). Mas ao mesmo tempo, ele
lhes dá esperança de que Deus os ajudaria, seria seu Redentor. A escravidão a
qual o povo foi submetido é descrita por Isaías como humilhante e exaustiva a
ponto de aniquilar as forças (Is 44.12; 49.4). Eles estavam indefesos diante do
poder do opressor.
Além disso,
quando o povo de Jerusalém chegasse à Babilónia, haveria um contraste
inquietante: a falsa grandeza dos deuses babilónios, que deram a vitória aos
opressores, e o aparente fracasso do Deus israelita, que não livrou seu povo.
Diante disso, eles precisavam ser animados e encorajados para continuarem
crendo e esperando que Deus lhes traria o livramento, quando o castigo pela
desobediência passasse. O profeta deveria dar uma mensagem de esperança para
que o povo não caísse na armadilha de achar que havia uma disputa entre os
deuses babilónios e o Deus de Israel. Embora temporariamente os babilónios
tenham sido vencedores, essa realidade não duraria para sempre. Sendo assim, o
profeta estava enviando Boas-Novas de salvação para num momento em que a
confiança em Deus ficaria muito tênue, diante da realidade do opressor.
2. A situação do povo que ficou em Jerusalém
Nas primeiras
deportações, o rei da Babilónia levou as pessoas mais nobres, ricas e as
pertencentes à corte real (2 Rs 24.12-17; Jr 52.28-32). Na última deportação,
foram levadas pessoas mais simples, como os funcionários da corte, sacerdotes,
levitas, ajudantes, serventes, artesãos, alguns agricultores e vinhateiros (2
Rs 25.9-12). Ficaram somente os extremamente pobres na periferia de Jerusalém.
O profeta Jeremias descreve a situação dos que ficaram da seguinte maneira: “A
nossa herdade passou a estranhos, e as nossas casas, a forasteiros. Órfãos
somos sem pai, nossas mães são como viúvas. [...] Os nossos perseguidores estão
sobre os nossos pescoços; estamos cansados e não temos descanso. [...] Servos
dominam sobre nós; ninguém há que nos arranque da sua mão. [...] Nossa pele se
enegreceu como um fomo, por causa do ardor da fome. Forçaram [estupraram] as
mulheres em Sião; as virgens, nas cidades de Judá” (Lm 5.2-3, 5, 8, 10-11).
Chegou-se até a afirmar que eram mais felizes os que morreram pela espada do
que pela fome (Lm 4.9).
3. O significado de Boas-Novas
Diante desse
quadro desolador, o profeta anuncia as Boas-Novas de salvação através do Servo
Sofredor, que tomaria o lugar miserável do povo. De forma contextualizada, é
justamente nesse estado que se encontram todos aqueles que estão afastados de
Deus, cuja situação é caótica e somente a graça de Deus anunciada nas
Boas-Novas é que pode trazer libertação e redenção.
A expressão
Boas-Novas vem da palavra hebraica basar, que no grego é euangelizo, de onde provém a palavra
“evangelho”. Sendo assim, quando anunciamos o evangelho, estamos cooperando com
Deus e dando prosseguimento ao que o profeta iniciou, proclamando que o Deus
libertador e perdoador está ao alcance de todos. É justamente a proclamação do evangelho que permite o acesso ao evangelho; por isso, o
imperativo ide (Mt 22.9; 28.19), que possibilita aos ouvintes libertação, de
acordo com o que Paulo escreveu: “Como, pois, invocarão aquele em quem não
creram? E como crerão naquele de quem não ouviram? E como ouvirão, se não há
quem pregue?” (Rm 10.14).
4. O anunciador de Boas-Novas
Por quatro
vezes em seu livro, o profeta faz menção ao anúncio de Boas-Novas (40.9; 41.27;
52.7; 61.1). O que aconteceria ao povo no cativeiro não poderia ser comparável
com a salvação que viria, e é por isso que ele anuncia Boas-Novas. Portanto,
quando o profeta pronuncia Boas-Novas, está dizendo que, apesar das
circunstâncias difíceis do cativeiro, Deus estaria agindo. Para provar isso,
ele evoca na sua profecia, diversas vezes, a obra da criação (e.g., Is
40.12-17, 21-31 dentre outros), como se, no momento do exílio, estivesse tudo
“sem forma e vazio”, mas Deus estaria se movendo sobre a face das águas (Gn
1.2) e, em breve, traria livramento para seu povo.
Da mesma forma,
os cristãos no mundo todo são chamados a proclamarem o evangelho de Cristo aos
que estão no cativeiro do pecado, do desprezo e da opressão, de tal forma que
todos alcancem aquilo para o qual Cristo veio: “[...] restaurar os contritos de
coração, a proclamar liberdade aos cativos e a abertura de prisão aos presos”
(Is 61.1). Isso porque, como afirma René Padilha, “a comunicação oral do
evangelho realmente é uma tarefa que os cristãos não podem esquecer.” Somos
convocados por Deus para tal tarefa ao recebermos o seu Espírito Santo: “Mas
recebereis a virtude do Espírito Santo, que há de vir sobre vós; e ser-me-eis
testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judeia e Samaria e até aos
confins da terra” (At 1.8). Assim sendo, porque Cristo foi ungido pelo Espírito
Santo, todos nós, seus discípulos, também o somos com o objetivo de tomar
conhecidas as Boas-Novas do evangelho. O profeta deixa claro que, para fazer a
obra de Deus dessa forma extraordinária, é necessário que, antes de tudo, haja
unção do Espírito Santo (At 1.8). Depois é que se segue o enviar (ide), o
proclamar (pregar), o consolar e o ordenar (serviços) (Is 61.1).
II - AS BOAS-NOVAS
DO EVANGELHO
Apesar de
Isaías prever muito juízo divino como consequência da desobediência à Palavra
de Deus, de descrever catástrofes bélicas e de aprisionamento do povo de Deus,
o profeta faz irromper, com todo ímpeto, a salvação de Deus em seu livro. É
algo extraordinário e belo observar a inspiração profética de Deus vindo em
socorro do povo, a começar pelo nome de Isaías, que significa “o Senhor salva”.
O verbo hebraico ysha
’, de cuja raiz vem o nome de Isaías, significa ajudar, salvar, resgatar,
auxiliar quem está em dificuldades, e é justamente isso que Deus faz com
Israel. Por isso, vários textos de Isaías mostram o Senhor Deus como o
salvador.
Outra palavra
utilizada por Isaías que denota Boas-Novas é “Redentor”, do hebraico go’el,
que é o que redime dívidas impagáveis, assumindo as penalidades do que deveria
ser castigado. Assim, Deus se coloca no lugar do pecador (Israel e gentios)
impenitente e lhe provê o perdão e o livramento do castigo. Isaías ainda usa a
palavra hebraica padah,
que também significa “remir” ou “resgatar”, ou seja, é Deus pagando o preço
pela libertação. Essas são as grandes Boas-Novas que Isaías anuncia, sem nem
mesmo compreendê-las plenamente, pois se cumpririam por completo apenas em
Cristo. Elas se resumem neste texto do profeta: “Por um pequeno momento, te
deixei, mas com grande misericórdia te recolherei; em grande ira, escondi a
face de ti por um momento; mas com benignidade eterna me compadecerei de ti,
diz o Senhor, o teu Redentor” (Is 54.7-8).
1. O evangelho é uma pessoa
O Evangelho é a
própria pessoa de Cristo. Nele se concentra toda a boa-nova de Deus para o
resgate do ser humano. Foi Ele que, com sua morte e ressurreição, tomou a
mensagem do Evangelho inconfundível. Quando Jesus morreu na cruz, nEle
concentrou-se todo o mal e toda a culpa humana, como um ralo gigantesco que
absorveu tudo aquilo que é contrário à plenitude da natureza humana para a qual
Deus nos criou. Cristo nos libertou da maldição da Lei, da condenação do pecado
e da separação de Deus, permitindo-nos estar unidos em comunhão com Ele, a
fonte da vida. Deus agora não olha mais para nosso passado como parâmetro para
nos aceitar e encaminhar nosso destino; porém, através da lente do evangelho,
Ele nos vê como sua delícia (“Hefzibá” conforme Is 62.4) e somos procurados por
Ele (Is 62.12) para uma vida de comunhão e intimidade.
Marcos é o
evangelista que nomeia o Evangelho como sendo o próprio Cristo (Mc 1.1), bem
como anuncia que o tempo do Evangelho chegou com Cristo (Mc 1.15) e Mateus
anuncia que as várias profecias de Isaías se cumpriram em Cristo (Mt 1.22-23;
2.15,23; 4.12-17; 12.17-21; 21.4-5). Ele abriria os olhos dos cegos e tiraria
de prisões aqueles que estavam em trevas. Por isso, Jesus é chamado em Isaías
de luz dos gentios (Is 9.2; 42.6-7), que os tirariam das trevas e lhes
iluminariam o acesso a Deus.
2. O evangelho é uma mensagem
O evangelho é o
poder de Deus operando para a salvação de todo aquele que crê (Rm 1.16). A
aceitação do evangelho em atitude de fé é a garantia da libertação de pecados,
medos e culpas, e também é a porta de entrada para a vida de liberdade que Deus
preparou para os seus filhos. “O Messias continuará a usar a pregação do
evangelho, para levar embora as cinzas da tristeza que os nossos obscuros
pensamentos amontoaram sobre a nossa cabeça, e a derramar sobre nós o óleo de
gozo.”
O profeta
salienta que Deus, contrastando com os ídolos, é aquEle que trabalha para os
que nEle esperam (Is 64.4). Na história da humanidade, nunca se viu ou se verá
um Deus assim, simplesmente porque não existe outro Deus. O trabalhar de Deus
em prol da humanidade perdida foi tão intenso que não poupou nem mesmo seu
único filho. Dessa forma, seu trabalhar estendeu-se para além de qualquer
expectativa humana, a ponto de entregar-se a si mesmo em Cristo, provando seu
grande amor incondicional e seu cuidado intensivo para com a situação
deplorável da humanidade, trazendo-lhes salvação, apesar de ninguém ser
merecedor de tão grande salvação, pois todos pecamos, “somos como o imundo, e
todas as nossas justiças, como trapo da imundícia” (Is 64.5-6).
Imundícia,
aqui, está relacionada à peça de vestuário suja de sangue de menstruação,
que contaminava cerimonialmente a mulher e também o homem que nela tocasse no
Antigo Testamento. Mesmo quando achamos que podemos estar agindo religiosamente
da melhor maneira, isso pode ser totalmente sem valor, pois quem nos justifica
é somente Cristo, ou seja, o evangelho é a garantia de que todas as nossas
impurezas, imperfeições, pecados e misérias são lavados pelo sangue do Cordeiro
e, assim, somos aceitáveis e queridos por Deus. O apóstolo Paulo faz coro ao
profeta quando afirma: “[...] As coisas que o olho não viu, e o ouvido não
ouviu, e não subiram ao coração do homem são as que Deus preparou para os que o
amam. Mas Deus no-las revelou pelo seu Espírito; porque o Espírito penetra
todas as coisas, ainda as profundezas de Deus” (1 Co 2.9-10).
3. O evangelho é um estilo de vida
O estilo de
vida proposto pelo evangelho não tem muito a ver com a cultura gospel impregnada em nosso país. E, na
verdade, um estilo de vida que imita Jesus em todas as coisas, numa atitude
radicalmente contrária aos valores observados ou impostos até mesmo pela
religiosidade. Seguir Jesus é dizer sim
a atitudes de amor e de esperança para um mundo sofredor.
Mas seguir a
Jesus também é ansiar pela presença e intervenção de Deus no mundo para que
haja salvação. Por isso, o profeta faz uma série de anseios, lamentos e apelos
proféticos apaixonados, que também devem ser nosso alvo, divididos da seguinte
forma:
A1.
Anseio: Pelo amor de Deus (63.15-16);
B1.
Lamento: Nosso coração endurecido (63.17-19);
A2.
Anseio: Desejo intenso pela presença e ação de Deus (64.1-5a);
B2.
Lamento: Nossos pecados permanentes (64.5b-7);
C. Anseio:
Desejo pelo toque perdoador de Deus (64.8-9);
Apelo: Que o
Deus ilimitado intervenha (64.10-12).
Assim, viver o
evangelho é ansiar profundamente (SI 42; 84) pela presença e manifestação de
Deus como única solução purificadora e regeneradora do ser humano. E bem
verdade que o pecado e o sofrimento nos acompanharão por toda a vida terrena;
mas em Cristo, sempre de novo e infinitamente, experimentaremos o poder
libertador, curador, restaurador e transformador do evangelho.
Algumas pessoas
são carregadas de vícios a serem abandonados, culpas do passado, precisam de
restauração de suas ruínas emocionais de sofrimento e dor, pois o pecado e o
sofrimento criam correntes de prisão da alma humana. Muitos não encontram saída
para tanta desolação e tristeza. Os mecanismos humanos não dão conta de
reconstruir o que se perdeu, ou entrou em ruínas. É nesse momento de caos,
assim como com Israel, que o profeta levanta a voz e diz: “E edificarão os
lugares antigamente assolados, e restaurarão os de antes destruídos, e
renovarão as cidades assoladas, destruídas de geração em geração” (Is 61.4).
Tudo isso é possível porque o Espírito do Senhor, assim como no Messias, é
sobre nós. Logo, a restauração da situação de miséria humana é um milagre
divino que ecoa e age porque Cristo toma isso possível. Foi por isso que Paulo
escreveu: “Porque não me envergonho do evangelho de Cristo, pois é o poder de
Deus para salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego”
(Rm 1.16). Portanto, os que vivem no evangelho vivem um novo estilo de vida não
mais condicionado ou aprisionado ao pecado e ao sofrimento humano, mas livre,
liberto e pleno de vida, porque Cristo permite a todos que o aceitam e vivem a
mensagem do evangelho que experimentem o seu poder transformador.
III - SALVAÇÃO
E ESPERANÇA
1. Deus ampara seu povo no cativeiro
O profeta,
descrevendo a situação do povo no cativeiro e prevendo salvação, afirma que o
livramento do Senhor virá em meio ao deserto e que este se tomará em caminho
reto. Passarão por vales e montanhas, porém estes se tomarão planos. Aquilo que
no momento está torto será endireitado, e o que é áspero se tomará liso (Is
40.3-4). Ele faz a promessa de que aqueles que, em meio à tribulação, ficarem
cansados e afadigados, se esperarem no Senhor, suas forças seriam renovadas
para uma caminhada sem fadiga e uma corrida sem se cansar (Is 40.29-31). No
exílio, o povo se sentiria muito longe de Deus, com muita sede dEle, mas Ele os
ouviria e lhes saciaria; Deus lhes promete que lugares desertos se
transformariam em mananciais de águas pelo seu poder miraculoso (Is 41.17-18).
Isso significa que Deus proverá para o seu povo as coisas essenciais em muita
abundância.
O profeta
descreve o amor de Deus semelhante ao amor materno (Is 49.15), não tendo outra
comparação que chegue mais perto desse amor, pois é a expressão de amor humano
mais gratuito que existe. Ainda assim, o amor materno pode falhar, mas o de
Deus nunca falha. Assim, Deus é descrito como amigo e interessado em livrar, perdoar,
libertar, curar e cuidar. Nesse sentido, o profeta Isaías descreve o amor de
Deus sendo: consolador (40.1; 51.12), que dá vigor ao cansado (40.29; 41.10), o
compassivo (49.13; 52.9), o pastor (40.11), o perdoador (55.7) e um Deus
próximo (45.3; 49.1,16). Dessa forma, o profeta desfaz uma imagem de um Deus
vingativo e irado, muito comum no Antigo Testamento, e mostra quem Ele
realmente é. Uma figura próxima do ser materno, a fim de expressar o amor de
Deus ao povo, é usada quando o profeta o chama de pastor (Is 40.11; 56.8;
57.18; 58.11). Ele assim o faz para mostrar que Deus cuida, guia, toma em seus
braços de amor e lhes traz descanso.
2. Deus livra o seu povo do cativeiro
A divindade
cultuada na Babilónia era Marduk que, aparentemente, enquanto o povo estava
debaixo da escravidão, levava vantagem. Marduk, na mitologia babilónica, era o
deus que havia vencido o monstro marinho e criado o mundo; logo, era o mais
poderoso. Por esse motivo, a profecia salienta a grandeza do Todo-poderoso Deus
de Israel, atribuindo a vitória sobre o monstro a Jeová (Is 45.5; 51.9) e
salientando várias vezes que Ele é o criador de todas as coisas (Is 43.7,15;
45.12), o único Salvador (Is 44.8; 45.5,6,18,21; 46.9), o Redentor e o Santo de
Israel (Is 41.14; 44.22; 54.5,8).
Certamente, a
dúvida pairava na cabeça de muitos israelitas se, de fato, essa divindade não
seria mais poderosa que o Deus Jeová. Entretanto, quem tem condições de
entender a história - e o profeta é um deles -prevê que, ao final das contas,
existe apenas um Deus que é verdadeiro, sendo os demais mui medíocres (Is
46.1), pelo simples fato de terem sido criados pelas mãos dos homens, o que nem
é parâmetro de comparação com o Deus de Israel. Pouco a pouco, o povo percebe
que são seus próprios pecados e desobediência que os trouxeram ao cativeiro (Is
43.27-28) e que o opressor nada mais foi que um instrumento do único Deus
verdadeiro para corrigir e dar vida novamente a seu povo.
Na profecia de
Isaías, Deus chama Ciro, rei da Pérsia, de “ungido” (Is 45.1), sendo ele o
instrumento para consolar e libertar seu povo do cativeiro no ano 539 a.C.,
apontando, desse modo, para o próprio Messias que, então sim, traria a
libertação completa (Jo 8.36). Para reacender a fé do povo quando estivesse no
cativeiro, o profeta lembra a eles o triunfo do êxodo, quando Deus interviu
milagrosamente para libertar o povo (Is 40.3-4; 43.19-21). Deus sabia que seu
povo ficaria confuso e com dúvidas no cativeiro. Por isso, o profeta
antecipa-se aos fatos com palavras de consolo e esperança (Is 49.8-10).
3. Um derramar abundante do seu Espírito
Em todo o
Antigo Testamento, o Espírito Santo é mostrado como o ser divino bastante ativo
e colocando tudo e todos em movimento, criando (Gn 1.2; SI 33.6), organizando a
caminhada do povo (Jz 3.10), inspirando e ungindo reis, profetas e sacerdotes
(1 Sm 19.21; Mq 3.8; Nm 3.3), e dando sabedoria (Ex 35.31); mas é em Isaías que
o Espírito Santo tem uma abrangência muito maior. Ele repousaria sobre o
Messias (11.2); seria derramado (32.15); faria cumprir a Palavra do Senhor
(34.16); está em todos os lugares (38.16); é autónomo (40.13); seria o protetor
(59.19); daria restauração e liberdade (61.1); faria um concerto eterno (61.8)
e daria descanso (63.14). O profeta prevê que Ele derramaria água sobre todos
os que tiverem sede de Deus e transformaria em rios onde houvesse uma terra
seca. “E a terra seca se transformará em tanques, e a terra sedenta, em
mananciais de águas; e nas habitações em que jaziam os chacais haverá erva com
canas e juncos” (Is 35.7). E ainda: “Abrirei rios em lugares altos e fontes, no
meio dos vales; tornarei o deserto em tanques de águas e a terra seca, em
mananciais” (Is 41.18).
Esse mesmo
Espírito agiu sobre a vida de Jesus (Mc 1.10; Lc 4.14,18) para curar, libertar,
transformar, operar milagres, consolar, ressuscitar mortos e realizar as obras
de Deus; e esse mesmo Espírito opera na vida da Igreja para fazer obras maiores
ainda (Jo 14.12); e é o Espírito Santo quem dá acesso ao Reino de Deus: “Jesus
respondeu: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer da água e
do Espírito não pode entrar no Reino de Deus” (Jo 3.5). Portanto, o Espírito
Santo age hoje de maneira muito mais intensa que nos tempos de Isaías, pois foi
ele quem previu um derramar abundante onde houvesse sequidão (Is 35.7).
Além de o
Espírito Santo colocar todas as coisas em movimento, atuar sobre reis e
profetas e ungir a Jesus de Nazaré, seu agir se dá no meio do seu povo e na
vida de cada crente em particular, levando ao arrependimento. Quando alguém
olha para dentro de si e percebe quantas coisas existem que não agradam a Deus
e se esforça para abandoná-las, isso pode levar a um colapso mental e
espiritual, pois ninguém consegue agradar a Deus plenamente. Porém, ao
reconhecer as falhas e procurar abandoná-las - o que o profeta chama de
arrependimento ou estar de coração contrito (Is 57.15) -, Deus imediatamente se
aproxima num acolhimento de amor, provendo sua presença curadora e
restauradora. Caso contrário, ninguém suportaria a dor de suas próprias
debilidades humanas. A isso o evangelho chama de graça divina. Aqueles cujo
coração é contrito, com estes o “Deus conosco” habita (Is 7.14; Mt 1.23) e
produz vivificação, ou seja, o que era sinal de morte passa a ser a essência da
vida.
Autor:
Claiton Ivan Pommerening
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