Nesta seção,
observamos que a preocupação central do profeta Isaías é a santidade de Deus;
assim, ele condena a idolatria e a altivez presentes na sociedade e aponta para
o dia do Senhor. Mas o que exatamente é o dia do Senhor? De acordo com Soares,
o termo hebraico para “dia” é yom, que pode significar “dia” literalmente (Jó
3.3) ou até período de tempo (Gn 2.4). Assim, segundo ele, o dia do Senhor
indica o período reservado por Deus para o “acerto de contas” com todos os
moradores da terra.
Gerhard von
Rad, estudioso do Antigo Testamento, analisa as imagens que acompanham esse dia
escatológico e conclui que o mesmo remonta às guerras santas do Senhor, ou
seja, esse dia se refere à ocasião em que Jeová aparecerá pessoalmente para
aniquilar seus inimigos.
Convém
registrarmos que não é apenas Isaías que utiliza esta expressão “dia do Senhor”
com suas trágicas consequências, pois há muitas ideias nos escritos proféticos
sobre a natureza desse tremendo dia (como se pode verificar na tabela que está
na próxima página).
Profetas
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Significado da expressão “dia do Senhor” nos
profetas
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Obadias
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Um tempo de julgamento e
retaliação.
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Joel
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Dia de destruição na vinda do Senhor (1.15;
2.1,11,31; 3.14).
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Amós
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Dia de grande escuridão para o mundo, mas também
para Israel (5.18,20).
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Isaías
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Dia de ajuste de contas para os soberbos e também
um dia de destruição cruel vindo do Altíssimo (2.12; 13,6,9).
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Sofonias
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Dia de grande ira da parte do
Senhor, o qual se aproxima muito rapidamente (1.7,14).
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Ezequiel
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Dia em que as nações se
lamentaram, quando Nabucodonosor empunhou a “espada do Senhor” ao conquistar
o Ocidente (13.5; 30,3).
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Zacarias
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Dia da ardente defesa de Jerusalém pelo Senhor,
quando todas as nações estarão reunidas contra ela (14.1).
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Malaquias
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O dia em que o Senhor esmagará os perversos e os
destruirá como refugo, precedido pelo ministério de restauração de Elias
(4.5).
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Portanto, não
existe uma única definição da natureza do dia do Senhor na literatura
profética, e sim diversos aspectos e imagens bíblicas que descrevem esse dia.
Contudo, a principal ideia está relacionada ao grande julgamento e restauração
do Reino do Senhor.
Também podemos
observar em Sofonias 1.15,16 uma das mais completas descrições do dia do
Senhor. Assim, lemos que o dia de Jeová é:
a) Um dia de
ira;
b) Um dia de
aflição e angústia;
c) Um dia de
ruína e devastação;
d) Um dia de
trevas e escuridão;
e) Um dia de
trombeta e grito de guerra.
Muitas dessas
características desse terrível dia, mencionadas no livro de Sofonias, também
estão presentes no livro de Isaías. Entretanto, em Isaías, o dia do Senhor se
refere principalmente à intervenção divina contra a altivez humana, expressadas
no apego excessivo às riquezas e a desvios morais que culminaram em corrupção e
idolatria, mas também diz respeito às histórias de proezas e grandes feitos de
Deus intervindo milagrosamente na história do seu povo, Israel (Is 2.6-9,
17-18).
Nesse caso de
Isaías, o dia do Senhor primeiramente alude à Judá e Jerusalém, mas também se
aplica aos últimos dias, pois a maioria das profecias bíblicas tem um
cumprimento imediato e um cumprimento remoto, ou seja, aplicam-se num período
de tempo próximo, mas também são aplicáveis há tempos mais distantes e
escatológicos. Isso é possível, porque Deus, conhecedor de todas as coisas, ao
inspirar sua Palavra, tinha propósitos muito mais amplos do que aquilo que o
profeta entendia para seus dias.
Estamos agora
no dia do homem, mas esse dia não vai durar para sempre. Naquele grande dia, o
Messias irá finalizar o dia do homem e realizar na história o dia do Senhor.
Abaixo, veremos algumas características dessa intervenção divina, com
consequências para Israel nos dias do profeta Isaías, mas que se estende até ao
período descrito escatologicamente como a grande tribulação (Ap 7.14).
I - A ALTIVEZ ORIUNDA DA PROSPERIDADE
No período
profético de Isaías, Israel experimentou muita riqueza e prosperidade, talvez
como em nenhum outro período depois do rei Salomão. O profeta escreveu: “E a
sua terra está cheia de prata e ouro, e não têm fim os seus tesouros [...]” (Is
2.7).
Por outro lado,
esse desenvolvimento econômico acabou não sendo visto como bênção de Deus; na
realidade, acabou se tornando em pedra de tropeço para o povo, uma vez que os
induziu a cometer uma série de pecados: corrupção, mentira, arrogância,
idolatria, enriquecimento ilícito, injustiças sociais e toda sorte de perversão
advinda de uma má compreensão da prosperidade, que resultou numa má utilização
da mesma (Is 2.8-12).
1. Riqueza e prosperidade
Primeiramente,
é necessário esclarecer que a Palavra de Deus não condena a riqueza ou o
enriquecimento (Gn 13.2; 1 Rs 10.23; Ec 5.19). Muitas vezes, as interpretações
sobre as riquezas na Bíblia acabam despertando posturas radicais: de um lado,
tem aqueles que, por conta do discurso piedoso, afirmam que as riquezas são um
mal em si, e, portanto, o povo de Deus não deveria ter posses. Já outros
incorrem em outro extremo: Deus enriquece todos que tem fé para receber essa
bênção. Como exemplo, podemos mencionar a conhecida teologia da prosperidade,
que cresce vertiginosamente dentro de muitas igrejas, inclusive de algumas que
outrora a condenavam.
Após
considerarmos esses dois polos, devemos analisar o fato de que a orientação
divina com relação à riqueza é no tocante ao acúmulo desnecessário, aos perigos
que a cercam, bem como as ações ilícitas para obtenção desta riqueza (Mt 19.23;
1 Tm 6.9). E aqui onde está nossa base de discernimento para sabermos a vontade
do Senhor, pertinente a esse assunto. O que sucedeu com o povo de Israel é que
os reis e suas mais altas autoridades acumularam para si riquezas
desnecessárias, mediante a prática de injustiças, indo contra o mandamento de
Deus, o que fez com que seus corações se corrompessem. Frequentemente, as
riquezas excessivas apartam o coração humano da confiança em Deus (cf. Lc
12.13-21; 34).
2. A Corrupção
A corrupção diz
respeito ao ato ou efeito de corromper. O profeta é categórico sobre a corrupção
do povo de Deus em seus dias. Senão, vejamos: “Os teus príncipes são rebeldes e
companheiros de ladrões; cada um deles ama os subornos e corre após salários;
não fazem justiça ao órfão, e não chega perante eles a causa das viúvas” (Is
1.23). A corrupção é coisa antiga e estava presente nos dias de Isaías. Na
verdade, a corrupção vem desde os primórdios da humanidade, pois, de acordo com
a Bíblia, ela já se manifesta na queda da humanidade no pecado (Gn 3). Nesse
episódio, aprendemos que a corrupção está relacionada não apenas com deixar de
ser puro ou ir contra o certo; ela também está ligada com a cobiça, ou seja, a
corrupção diz respeito a não satisfação com o que se tem e, portanto, resulta
em todo tipo de ação (ainda que desonesta) para obter o que se não tem.
Devemos
considerar as formas de corrupção e o modo como elas envenenam nossas relações
e dificultam todas as possibilidades de uma vivência sadia com Deus e com o
próximo. Primeiramente, a corrupção pode assumir quaisquer formas diferentes,
dependendo do lugar. Por exemplo, existe a corrupção política, a ideológica, a
corrupção dos valores de uma família, a corrupção do evangelho, e por aí em
diante. Em segundo lugar, é necessário também dizer que quando a corrupção é
descoberta, ela já corrompeu todo um conjunto de barreiras éticas e morais.
Isso pode ser explicado, por exemplo, com o fato de que a corrupção política
descoberta no Brasil - motivo de debate hoje em dia - já está em várias áreas
da sociedade brasileira, e a política é apenas um reflexo do estado interno da
própria sociedade que escolheu fazer da corrupção e do “jeitinho brasileiro” um
forte aspecto da sua constituição cultural.
Por outro lado,
a oposição à corrupção é vista como símbolo de fraqueza, de caretice e medo
ante a esperteza dos que, engodados pela cobiça, estão dispostos a passar por
cima de tudo e de todos. Felizmente, a coragem do profeta Isaías para denunciar
os pecados de Israel, assim como anunciar o juízo divino, bem como o exemplo de
Jesus Cristo, nosso Senhor, são fontes de inspiração no enfrentamento da
corrupção. Lemos nos Evangelhos que, por diversas vezes, Jesus foi tentado pelo
Diabo a se corromper, por meio da ganância, da fama e da celebração do poder.
Mesmo assim, Jesus não “se desviou com os assuntos deste mundo”, permanecendo
fiel à missão recebida do Pai celestial (Mt 4.1-11). Dessa maneira, Jesus
tomou-se modelo para todos aqueles que pretendem fazer a diferença no mundo,
não se permitindo, assim, ser moldados pela corrupção do mundo (Rm 12.1-2).
3. A Idolatria
Jesus afirmou
que onde estivesse o tesouro de alguém, ali estaria o seu coração (Mt 6.21), ou
seja, o coração pode seguir as ações de alguém e vice-versa. O povo de Israel
demonstrou isso ao permitir que a riqueza e a prosperidade começassem a desviar
seus corações do Senhor, e isso os levou a adorarem falsos deuses e ídolos (Is
2.6-8). Qualquer coisa que tome o lugar do Senhor como prioridade última em
nossa vida toma-se um ídolo. Este sempre é opaco, ou seja, ofusca aquilo que se
quer buscar, passando a apontar para si mesmo. O ídolo serve como um substituto
muito fútil para Deus. Inclusive a religiosidade e denominações religiosas
podem se tomar um ídolo quando passam a manipular o povo para obter vantagens
próprias e adquirir poder (não do Espírito Santo, mas de forças humanas), ou,
quando elas se tomam um fim em si mesmas. O povo havia se dobrado diante da
loucura dos povos pagãos e se ajoelharam diante de ídolos feitos por mãos
humanas. Assim, a arrogância fez com que se instalasse a degradação moral,
social e religiosa, muito semelhante aos dias atuais (Is 2.8).
II - O DIA DO SENHOR PARA
ISRAEL
A expressão dia
do Senhor no livro do profeta Isaías simboliza eventos futuros e escatológicos
e também quer expressar o sentido de iminência e de gerar expectativa. Para
Israel, era símbolo de que Deus viria destruir o mal e os pecadores (Is 13.9;
J1 1.15; Sf 1.7), mas também como símbolo de estabelecimento de paz e
prosperidade. Assim, o povo de Deus seria finalmente vingado por todos os
sofrimentos impostos pelas nações pagãs que o dominaram, resultando em más
condições económicas, sociais e políticas (Is 2.4). Sendo assim, esse dia
possui tanto aspectos políticos quanto espirituais. Na realidade, na
perspectiva profética do Antigo Testamento, não se separa política e vida
religiosa, ambas se encontram entrelaçadas.
Contudo, o
Senhor Deus é justo e não poupa inclusive ao seu próprio povo de Israel, quando
este se envolve em pecados (cf. Is 2.6-10). Assim sendo, podemos constatar que
os aspectos condenatórios do dia do Senhor que Israel acreditava se referir
apenas aos seus inimigos acabaram por ter um cumprimento imediato e recair
sobre si mesmo. Isso ocorreu quando o povo de Deus foi levado para os
cativeiros assírio e babilônico, tendo as consequências que veremos adiante.
1. O Abatimento do orgulho
No dia do
Senhor, a prioridade é dada aos pecados de Israel. No capítulo 2 de Isaías, o
Senhor dirige a palavra de julgamento à Judá e Jerusalém. Israel é declarado
culpado de muitos pecados, sendo a falta de autenticidade nos cultos, o
orgulho, bem como a idolatria, os maiores exemplos. No capítulo 1, o Senhor diz
que a adoração de Israel não é autêntica. O Senhor não tem prazer nos animais
que eles sacrificam. Quando o rito externo da religião não vem acompanhado de
atitude sincera e verdadeira do coração, o resultado só pode ser o
descontentamento divino (Is 1.13-15).
Tal atitude
displicente do povo para com Deus revela um coração orgulhoso, de quem se vê de
modo distorcido, maior e melhor do que de fato é. Com isso se despreza o culto
ao Senhor, incorrendo em falta de dependência de Deus (Is 1.4). Por isso, a
demonstração da ira do Senhor contra os obstinados de Israel será violenta, de
acordo com a estupidez que o orgulho traz consigo (Is 1.20; 2.12). Deus não
permitirá que o fraco seja espoliado para sempre, conforme a profecia de Isaías
(Is 1.26; 3.15). O dia do Senhor será tão pesado para Israel diante do pecado
do orgulho que o profeta aconselha o povo a entrar nas rochas e se esconder no
pó (Is 2.10). O pó era sinônimo de extrema humilhação. Nos tempos antigos,
quando alguém queria demonstrar humilhação diante de uma atitude errada,
sentava-se literalmente no pó, por vontade própria; aqui, porém, o profeta está
dizendo ao povo que, como eles não o fizeram por vontade própria, eles seriam
forçados a fazê-lo diante da calamidade que viria.
2. A Destruição da idolatria
O profeta
denuncia a idolatria de Israel, em que a criatura é servida como se fosse Deus
(Is 2.8-9). Ainda hoje, muitos entre a humanidade adoram obras feitas por mãos
humanas, em explícita ofensa ao Criador, o único digno de adoração. Essa
descrição profética de acusação de Israel pode ser relacionada ao materialismo
atual, onde o ser humano atribui grande valor aos objetos materiais, em detrimento
das pessoas.
Também, em
nossos dias, o valor das pessoas é medido pela quantidade de bens que conseguem
angariar; dessa forma, os pobres e marginalizados são desprezados e
desvalorizados. Há apreço apenas pelos ricos e afamados, e, assim, a soberba
humana é cultivada enquanto Deus é desprezado. Mas chegará o dia do Senhor, em
que a glória da sua majestade afugentará os pecadores. Nesse dia, os soberbos
serão abatidos e humilhados. Apenas o Senhor Deus será exaltado naquele dia (Is
9.2-12). Então, haverá um reconhecimento de que a idolatria para nada serve (Is
2.20); quando perceberem que toda inclinação aos ídolos lhes colocou em mais
apuros, eles os lançarão todos ao chão (Is 2.18,20), demonstrando que
finalmente reconhecem que não têm valor. O dia do Senhor para eles será tão
angustiante que eles se meterão nas cavernas das rochas e nos buracos da terra
(Is 2.19, 21). Nesse dia, eles reconhecerão que há somente um Deus verdadeiro.
3. O Estabelecimento da paz completa
Quando Israel
reconhecer o senhorio do Senhor e receber o Messias como o enviado de Deus para
restaurar a nação, então se estabelecerá a verdadeira paz e prosperidade. Será
um período tão esplendoroso para Israel que as nações de toda terra afluirão
para Jerusalém para aprender sobre os caminhos do Senhor e haverá justiça em
toda terra (Is 2.1-4).
Nesse dia,
quando Jesus Cristo reinar sobre todos, haverá uma grande mudança no rumo das
nações: os orçamentos militares serão utilizados para o desenvolvimento
agrícola; espadas e lanças (armas) serão convertidas em enxadões e foices. E
finalmente, o mundo estará em paz, vivenciando o shalom de Deus: “Não levantará espada nação contra nação, nem
aprenderão mais a guerrear” (Is 2.4; 60.18; Ap 21.3-4). Trata-se, sem dúvida,
de uma grande promessa para o nosso mundo, uma vez que, todos os anos se gastam
milhões de dólares na fabricação de armas de guerra em todo o planeta. As mais
poderosas nações estão continuamente reforçando seu aparato militar. Há em todo
o mundo um clima de guerra iminente no ar, especialmente com o crescimento da
tensão entre o Oriente e o Ocidente, devido aos crescentes atentados por parte
de grupos extremistas islâmicos, etc.
Portanto, o
medo está por toda parte, não há paz no mundo. Mas no futuro prometido pelo
Senhor, ninguém mais precisará temer a guerra. Não serão mais investidos
recursos econômicos em ferramentas que fomentam a morte e o medo, porque
reinará o príncipe da paz, Jesus Cristo.
III - O DIA
DO SENHOR PARA A IGREJA
As imagens de
Isaías concernentes ao dia do Senhor nos concedem uma base muito rica para a
leitura do dia do juízo, de acordo com o Novo Testamento. Porém, precisamos
considerá-lo não apenas teoricamente, como algo distante de nossa realidade
presente, mas também devemos aplicar a ameaça e promessa inerentes ao dia do
Senhor para a realidade eclesiástica. Não basta sermos cristãos apenas
nominais, que conhecem as profecias bíblicas, mas que não andam em conformidade
com a justiça. Portanto, quando a justiça na comunidade não é o objetivo do
povo de Deus, quando guerras, pobreza, preconceito e outros pecados são aceitos
como inevitáveis e a segurança é baseada em condição étnica, eclesiástica ou
socioeconômica privilegiada, então, o dia do Senhor, que é essencialmente
futurístico, tem algo a nos dizer no presente. Sua mensagem nos confronta no
dia de hoje.
Nesse sentido,
o livro de Isaías não deve ser interpretado fora do seu contexto no que diz
respeito a sua mensagem, mas podemos extrair dele princípios que podem ser
ampliados para a Igreja. Lembrando também que a palavra profética pode ser
subdividida em pelo menos três grupos:
1. Profecias
sobre o povo de Israel;
2. Profecias
sobre a obra futura do Messias;
3. E, por fim,
profecias sobre a sequência dos últimos acontecimentos.
Esse terceiro
grupo não está relacionado unicamente ao povo de Israel ou à comunidade cristã
primitiva, apesar de elas serem anunciadas no contexto desses dois momentos
históricos. As profecias do terceiro grupo se ampliam para cumprir a ação de
Deus sobre a história final da humanidade, onde se juntarão todos os povos e se
dará o fim histórico dessa era.
Decerto,
devemos ter em mente que, apesar de Deus transmitir sua mensagem em tempos
diferentes e de modos específicos, sua intenção com a sua criação permanece a
mesma: chamar a humanidade para a reconciliação com Ele (Is 55.1-3; Hb 1.1-2).
Esse objetivo divino permite a compreensão da mensagem de Isaías, ou seja, o
sentido das suas palavras para nossos dias. Isso ocorre a partir do momento em
que entendemos que existe um “elo” entre a ação de Deus sobre Israel e a ação
de Deus sobre a Igreja: o cuidado e o interesse salvífico de Deus sobre o seu
povo. Por outro lado, é necessário entender que a Igreja é a ampliação do
projeto de Deus para com Israel, que, na verdade, era um projeto que deveria se
ampliar para a humanidade toda (cf. Rm 11). Deus anuncia o seu dia porque
deseja, antes de tudo, restaurar a criação e levá-la ao estado perfeito de seu
projeto original.
1. A Preparação para a vinda de Jesus
O dia do Senhor
para a Igreja expressa também a ideia de julgamento, juízo e condenação. No
Novo Testamento, Mateus 25.31-46 descreve o discurso escatológico de Jesus, que
termina assinalando a separação que haverá entre os salvos e os não-salvos.
Assim, o dia do Senhor convida a Igreja a atentar para a Palavra de Deus em
obediência para que estejamos incluídos no grupo dos salvos. “Sejam praticantes
da palavra, e não apenas ouvintes, enganando-se a si mesmos” (Tg 1.22 — versão
NVI). A vinda de Cristo será precedida por uma grande proliferação de abandono
das leis do Senhor, querendo a humanidade estabelecer substitutos para o culto
a Deus (2 Ts 2.3-4).
Algumas
criações que a humanidade realizou ao longo da história, tais como o
consumismo, a confiança excessiva na parafernália tecnológica e a centralização
excessiva na capacidade de governar a vida podem ser maneiras de expressar o
abandono da dependência que devemos ter do Senhor. Dessa forma, resulta no
mesmo caminho de perdição que os israelitas percorreram. A autossuficiência, o orgulho
e a arrogância também são considerados problemas que nos seduzem a retirar Deus
do centro de nossas histórias. Por conseguinte, tal como Isaías chamou o povo a
voltar para os caminhos do Senhor, o Espírito Santo nos convida o tempo inteiro
para um retomo à dependência de Deus e também concedermos a Ele a centralização
em nossa história de vida. A promessa do dia do Senhor para a Igreja é o
lembrete de que o dia do homem (tempo histórico) é passageiro, mas que o dia do
Senhor (eterno) se estabelecerá de forma definitiva e perene.
2. Como será este dia?
Ao longo da
tradição cristã, o dia do Senhor é frequentemente associado à segunda vinda de
Cristo. Existem várias correntes que tentam interpretar como será o grande dia
do Senhor. Como fruto disso, surgiram algumas interpretações como milenistas:
pré, pós e amilenistas; e também as concepções tribulacionistas:
pré-tribulacionismo e pós-tribulacionismo.
A principal
perspectiva cristã é a pré-tribulacionista, ou seja, a que acredita na obra de
Cristo que removerá a sua Igreja do mundo antes da Grande Tribulação. A
Tribulação será uma das formas de manifestação do juízo de Deus para com
aqueles que não viveram de acordo com a sua Palavra. A Bíblia se refere a esse
período como um dos mais terríveis dias da história da humanidade, considerando
os acontecimentos que vivenciarão os que ficarem na vinda do Senhor. Mas para
os salvos, será o encontro com o seu Senhor e Salvador, um evento de grande
celebração (1 Pe 4.13), pois culminará na redenção final. Para esses, Jesus
voltará do mesmo modo que partiu, ou seja, ascenderá dos céus (At 1.11; Ap
1.7). O apóstolo Paulo dá-nos uma ideia de como será: “Porque o mesmo Senhor
descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e
os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro; depois, nós, os que ficarmos
vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor
nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor” (1 Ts 4.16-17). Cabe, aqui, um
alerta: não devemos tentar decifrar como exatamente esses eventos ocorrerão,
pois o importante é que o Senhor nos transmitiu a mensagem de que será um tempo
novo na história, onde se manifestará a plenitude do Reino de Deus: o seu
grande dia.
3. Atitudes diante do dia do Senhor
O futuro é
preocupação de todo ser humano, pois a incerteza gera, na maior parte dos
casos, angústia e desconforto. Talvez o povo de Israel e a Igreja Primitiva
tenham passado por essa experiência de ter que lidar com as incertezas do
futuro. Por isso, o Espírito de Deus revela alguns sinais para sua Igreja
mediante a Escritura de como será o dia do Senhor. Mas devemos entender que são
apenas sinais que nos auxiliam na percepção da experiência gloriosa do Reino,
não devendo ser tidos como únicos e últimos. Além disso, não devemos nos
esquecer também de respeitar a linguagem do gênero literário apocalíptico para
nos ajudar a entender de maneira adequada a mensagem do grande dia do Senhor.
Precisamos ter cuidado para não ficarmos focados no quando e no como será o
dia do Senhor, a ponto de nos esquecermos de quem está voltando. A atitude deve
ser de grande expectativa para com o amado das nossas almas, aquEle que por nós
deu sua vida para nos resgatar da morte e do Inferno. Jamais a riqueza, a
prosperidade ou o trabalho devem servir de impedimento para a expectativa da
vinda do Senhor Jesus (1 Ts 4.13-18). Não pode haver a fuga do presente, um
descaso com tudo como desculpa de Sua vinda, nem viver ignorando a volta dEle
como se Ele nunca fosse voltar. No entanto, a promessa de restauração e triunfo
final da glória do Reino que vai restaurar a justiça, acabar com o choro e
destruir o poder da morte e de Satanás precisa nos convidar a ir ao encontro
desse cumprimento final.
O Senhor nosso
Deus, em sua graça, não deseja que sejamos uma Igreja que foge dos desafios da
realidade social, econômica, política e pecaminosa de nossos tempos. Nossa
missão não se destina a esperar unicamente a concretização do dia do Senhor.
Pelo contrário, por existir a certeza de que Jesus Cristo virá, então devemos
nos lançar no mundo, anunciar essa restauração futura e mostrar o que Deus tem
preparado a partir de sinais presentes em nossa realidade. Noutras palavras, a
Igreja é desafiada a: enxugar o choro dos que choram, porque no Reino futuro não
haverá choro; pregar o evangelho para os aprisionados, porque o Reino de Deus é
de liberdade; restaurar famílias, porque o Reino de Deus é de restauração; e a
pregar e viver a justiça, porque o Reino de Deus é de Justiça.
O Dia do Senhor
é o momento histórico aguardado pela Igreja de Deus com expectativa e
esperança. É o momento em que finalmente o projeto de Deus se tomará pleno e
sua glória será manifesta a todos e sob todas as formas. Nessa esperança é que
deve residir a força que nutre a Igreja de continuar a pregar a justiça e a
salvação a todos os povos (Mt 28.19-20; Rm 8.18-25; Ap 21.1-7).
Autor:
Claiton Ivan Pommerening
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