O sentido de
algumas palavras pode ser compreendido através da estrutura de seus elementos
mórficos. A palavra divisão, por exemplo, é uma
dessas. Ela possui o prefixo “di", que significa duplicidade, e o termo “visão”,
que pode assumir vários significados. Entretanto, prioritariamente, pode ser
entendido como a “percepção do mundo exterior” ou "aquilo constituinte de
uma expectativa ou um desejo”. Assim sendo, ocorre a divisão quando duas
pessoas juntas têm visões distintas sobre o mundo exterior, ou quando, entre
elas, os ideais ou os desejos não são compatíveis. Como dois andarão juntos se
não estiverem de acordo? (Am 3.3)
A divisão,
dessa forma, cria dificuldade para as coisas permanecerem estáveis. Por isso, o
Senhor Jesus disse: "todo remo dividido contra si mesmo é devastado; e
toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá” (Mt 12.25).
Destruição completa e queda, assim, são consequências da divisão. Isso decorre
do princípio, segundo o qual, um plano somente será viável caso persista em
suas características iniciais. Havendo divisão, surgirão novos projetos.
Todavia, a glória do original jamais será restaurada.
Em toda a
história da humanidade, observam-se muitas “quedas e devastações” decorrentes
da divisão. Aconteceu, por exemplo, na partição de Israel, depois dos períodos
áureos de Davi e Salomão, ocasião em que a terra santa foi dividida entre o
Reino do Norte e o do Sul. Os dois Reinos foram decaindo gradativamente até
serem levados cativos para terras longínquas. O Reino do Sul, Judá, ainda
conseguiu retornar para Jerusalém. Entretanto, depois de subjugado, finalmente,
no ano 70 d.C., foi esmagado por completo pelos romanos, acontecendo a
Diáspora. Israel nunca mais foi o mesmo depois da divisão. Queda e devastação foram
observadas no Império Grego, depois da morte de Alexandre, o Grande, quando o
reino foi dividido em quatro partes e, aos poucos, entrou em declínio, até
ficar completamente absorvido pelo Império Romano, o qual, séculos depois,
também entrou em colapso pela ocorrência desse mesmo processo.
A partir do
século XV, o comércio de africanos como escravos para diversas partes do mundo,
inclusive para o Brasil, não foi decorrente de invasões estrangeiras naquele
continente, mas sim por causa de guerras entre etnias africanas inimigas. As
pessoas das linhagens derrotadas nas batalhas eram vendidas aos comerciantes
árabes e europeus, embarcando em navios negreiros para nunca mais retornarem à
sua terra natal. "Assim, consta que o comércio de escravos que se estabeleceu
no Atlântico entre 1450 e 1900 contabilizou a venda de cerca de 11.313.000
indivíduos”.
Atualmente, a
África está dividida em 54 países, sendo o continente mais pobre do mundo,
corroborando para tal circunstância, dentre outras, a profunda divisão étnica e
cultural ali existente, gerando, ainda, prolongadas e sangrentas guerras em
diversos países. Como mencionado, Jesus advertiu que um reino dividido contra
si mesmo seria devastado. Muito lamentável.
Na história do
século XX, de igual forma, alguns países tiveram grandes prejuízos por causa de
divisões, como são os casos da Coreia e Alemanha, que se separaram após a 2a
Guerra Mundial.
Com a queda do
muro de Berlim, no dia 9 de novembro de 1989, e a reunificação da Alemanha
Oriental e Alemanha Ocidental, o novo país restaurado se transformou numa das
maiores economias do mundo. A antiga Coreia, entretanto, nunca se reunificou.
Hoje, a Coreia do Norte continua empobrecida, com graves agressões aos direitos
humanos (desenvolveu apenas sua indústria bélica), e a Coreia do Sul ainda está
em processo de desenvolvimento.
Da mesma forma
que aconteceu com vários países do mundo ao longo da história, inúmeras
famílias também têm se desintegrado por causa da divisão instalada. No início
da década de 1980, o mundo parou para assistir pela TV o enlace matrimonial
entre o príncipe Charles e a princesa Diana, considerado o casamento do século.
Anos depois, tendo a divisão se alojado naquela família real, o lar não
subsistiu. Com as traições, conspirações e mortes, a sua ruína foi completa.
Desfecho
distinto aconteceu com o casal Clinton. Mesmo com a infidelidade do esposo e
então presidente americano, Bill Clinton, sua esposa, Hillary, decidiu
permanecer no casamento. Posteriormente, em 2009, ela assumiu o posto de Secretária
de Estado do seu país e, atualmente (2015), está cotada para concorrer à
presidência dos EUA pelo partido Democrata. O casal enfrentou toda sorte de
turbulências e, mesmo assim, ficou junto e, hoje, pode continuar o projeto de
vida em comum.
Como dito
antes, “havendo divisão, surgirão novos projetos”. Esses novos planos podem dar
muito certo numa empresa onde, fazendo a repartição em segmentos, são
estabelecidas diversas personalidades jurídicas (divisões) para as áreas de
seguros, previdência, capitalização bancária, etc. O problema é que isso não
vale, necessariamente, para a família, projeto feito para durar para sempre.
Portanto, quando a divisão acontece na família, faz emergir inexoravelmente a
presunção de dificuldades.
A história da
família do patriarca Isaque, filho de Abraão, apresenta, com riqueza de
detalhes, pessoas muito comuns. As características desses personagens são
vistas, ainda hoje, em qualquer família contemporânea. Não se trata, pois, de
um épico judaico com elucubrações fantasiosas, mas sim da narrativa de uma
família que conviveu com os defeitos dos seus membros e enfrentou, por isso,
questões interpessoais mal resolvidas. O relato é crível, verossímil,
plausível, real. Trata-se de um primor, uma obra perfeita e excelente.
I. Uma Família Abençoada
1. Pré-história
E importante
conhecer a história anterior ao nascimento de Isaque, a fim de se dimensionar o
status desse
homem excepcional e, a partir daí, compreender melhor todo o desenrolar de sua
vida familiar.
Um homem da
antiguidade, para ser feliz, precisava de duas coisas básicas: possuir uma
terra para viver e ter um filho para preservar sua memória. Abrão morava em Ur
dos Caldeus, uma terra que não era sua, e cuidava de 1x5, um filho que não era
seu. Ele tinha riquezas, amizades, destaque social em Ur, porém não tinha uma
família completa e feliz. Um dia, o Altíssimo o mandou ir embora, e ele foi.
Era preciso somente seguir as instruções para receber uma terra como herança e
poder gerar um filho. Abrão queria alcançar a promessa, e o primeiro passo para
isso era chegar a bom termo em sua jornada.
O Todo-Poderoso
não lhe deu um mapa; apenas o mandou sair de Ur, e ele partiu. Por que Deus fez
isso? Porque o Eterno queria que Abrão fosse um referencial de fé para sua
família e para todo mundo, porque nele seriam benditas todas as famílias da
terra (Gn 12.3).
Deus prometeu
ao patriarca fazer dele uma grande nação (Gn 12.2). Entretanto, depois, o
Senhor lhe deu uma promoção: garantiu fazer dele “pai de multidões de nações”
(Gn 17.4,5). Por isso, Deus mudou o nome de Abrão para Abraão, como também
alterou o nome da sua esposa para Sara (Gn 17.15,16), pois ela seria “mãe das
nações” e de “reis de povos”.
Muitos anos
após chegar à terra de Canaã, e depois de diversos equívocos cometidos pelo
ilustre casal, em cumprimento às inefáveis e gloriosas promessas de Deus,
nasceu o herdeiro de todas as bênçãos que pendiam sobre Abraão e Sara, o qual
foi criado em um lar no qual havia amor e carinho; talvez, em todos os tempos,
ninguém tenha sido, como filho, tão amado como Isaque, que se constituiu em um
presente inefável do Altíssimo na velhice dos seus pais e motivo de alegria
(riso — Gn 21.6,7) para toda a sua família.
2. Casamento no Senhor
Com uma
educação primorosa, tanto no aspecto espiritual quanto no moral, Isaque
transformou-se num homem excelente. Ele era um homem de oração. Depois da morte
de sua mãe, Abraão entendeu que era chegado o momento do casamento de seu
filho. Enquanto Eliézer foi buscar uma esposa da linhagem paterna para ele,
Isaque foi orar (Gn 24.63). Ele conhecia o Senhor, o qual, muitas vezes, no
futuro, se identificaria como sendo o Deus de Isaque.
Tudo aconteceu
de forma maravilhosa. Isaque e Rebeca se casaram no Senhor, cheios de alegria
(Gn 24.67). As coisas começaram muito bem, pois contaram com a direção do
Altíssimo, a bênção dos pais e o sentimento de amor recíproco dos nubentes.
Eles formavam o
casal sobre o qual repousariam bênçãos divinas inigualáveis. O casal se
constituía em paradigma de amor conjugal, espiritualidade e moralidade. Eles
tinham uma casa edificada sobre a Rocha, conheciam o Senhor e eram submissos à
sua palavra.
Isaque e Rebeca
viviam assim, compartilhando vidas, sonhos e emoções, como veremos a seguir.
3. História que se repete
O desejo de ter
uma família feliz passava, necessariamente, pelo nascimento de um filho, porém
Rebeca era estéril. Não haveria o futuro profético tão almejado sem um filho.
Uma enorme dificuldade para o novo casal que, junto, sonhava com o nascimento
de um herdeiro, para ser aquele através do qual descenderiam tantos como as
estrelas do céu. Abraão e Sara, os pais de Isaque, passaram pelo mesmo problema
com Sara, e eles tentaram resolver a questão pelo modo deles (com a egípcia
Agar), e não deu muito certo, pois criaram um embaraço para toda a
descendência, o qual, inclusive, permanece até hoje, o conflito
árabe-israelense.
Isaque e
Rebeca, ao contrário, não pegaram nenhum "atalho”; antes entraram pelo
caminho da oração. Eram pessoas de fé. Após vinte anos de oração, Rebeca engravidou
e nasceram-lhes gêmeos (Gn 25.20-21; 26). Glória a Deus, o qual, após isso,
confirmou a promessa: a descendência de Isaque seria como as estrelas do céu
(Gn 26.4). Por outro lado, a vida financeira e social da família de Isaque
estava indo muito bem (Gn 26.12-14). Não lhes faltava nada. Afinal de contas,
"a bênção do Senhor é que enriquece, e Ele não acrescenta dores” (Pv
10.22).
II. Problemas
1. Pais com preferências filiais
No momento em
que mais a família precisava caminhar junto, formando um laço indestrutível,
para exemplo em todas as famílias do mundo (Gn 12.3), um aspecto bastante ruim
começou a se manifestar no caráter de Isaque e Rebeca (Gn 25.28).
Isaque se
afeiçoou profundamente pelo filho Esaú, o qual era homem de ação, de luta, de
embates, que sabia como alvejar, com seu arco, uma caça que se movia
rapidamente, além de conhecer, talvez até melhor que a mãe, o tempero da comida
que era agradável ao pai. Esaú era a satisfação para seu velho pai, porém não
dava prazer ao Altíssimo. Ele era profano (Hb 12.16). O interessante é que a
Bíblia não mostra Isaque repreendendo Esaú pelos seus graves equívocos
comportamentais. Ao que tudo indica, o pai se omitiu de ensinar o filho como
andar com o Todo-Poderoso, diferentemente da conduta de Abraão. Filhos criados
de forma diferente apresentam sempre diferenças importantes. Os ensinamentos
recebidos não foram suficientes para tornar Esaú em um homem de fé.
Rebeca, por sua
vez, amava o caçula, um moço pacato, de hábitos caseiros. Possivelmente, ele não
sabia, sequer, utilizar arco e flecha e nunca tinha matado uma gazela. Isso não
era importante para sua mãe, que gostava de vê-lo em casa, em atividades pouco
agressivas. Talvez Rebeca se sentisse consolada por sua preferência por causa
de uma revelação divina recebida, segundo a qual o filho maior serviria ao
menor (Gn 25.23). Contudo, como a palavra profética não havia sido dirigida a
Isaque, eventualmente ele não tenha acreditado na veracidade dessa promessa.
Pelo que se
percebe do texto bíblico, essas preferências dos pais não eram em nada
dissimuladas. Os irmãos, desde muito jovens, sabiam perfeitamente da forte
divisão naquela abençoada família. Certamente, era uma questão incómoda para
todos. As esposas de Esaú, os criados, os pastores de Isaque, todos, enfim,
deveriam conhecer bem de perto o antigo problema familiar, através dos sinais
claramente perceptíveis que Isaque e Rebeca emitiam. Os pais faziam questão de
tomar partido. Isso é lamentável.
2. Filhos com cosmovisões distintas
Quando a
divisão se instala na família, os danos são imprevisíveis. A maneira
diferenciada dos pais tratarem os irmãos repercutiu, certamente, no
desenvolvimento emocional de ambos. A Bíblia não diz expressamente, entretanto
seria natural que o pai tratasse com desdém, vez por outra, a presença
“desinteressante” do filho mais novo, ao passo que vibrasse e sorrisse
efusivamente com as façanhas do primogénito. Em contrapartida, da mesma forma,
é provável que a mãe sempre implicasse com os "maus modos” do mais velho e
guardasse sempre a melhor comida para o caçula, dentre outras coisas pontuais,
que, ao longo da vida, foram distanciando emocional e espiritualmente os pais
dos filhos, bem como os irmãos entre si — que acabaram absorvendo cosmovisões
diferentes. A vida de Jacó era agradável ao Eterno (Ml 1.2; Rm 9.13), já Esaú
era sexualmente descontrolado (prova disso é que se casou com duas mulheres
pagãs, as quais trouxeram muita aflição à família patriarcal (Gn 26.34,35) e,
depois, com uma terceira (Gn 28.9)). Ele também não respeitava as coisas santas
do Senhor. Era, por isso, fornicador e profano (Hb 12.16). Jacó valorizava as
coisas espirituais, e Esaú as materiais (Gn 25.34), razão pela qual, aos
quarenta anos, casou-se com duas mulheres ímpias, enquanto que o caçula decidiu
esperar em Deus pela esposa certa (Gn 27.46), vindo a se casar somente aos 84
anos! (A demonstração disso está no Capítulo 4, item 1.1).
3. Rompimento familiar
Iniciada como
uma fagulha, ainda no ventre materno (Gn 25.22,23), a divisão concretizou-se decisivamente
aos 77 anos de convivência dos irmãos, no momento em que o pai, já cego e
debilitado, achava que iria morrer.
Depois de Jacó
enganar o pai e Esaú, o último elo entre os irmãos foi totalmente desfeito. O
que era “apenas” inimizade tornou-se ódio descontrolável. O campo de
treinamento de Deus, a família, transformou-se em campo de batalha entre
irmãos. A guerra estava deflagrada abertamente, e Rebeca, sempre muito
perspicaz, ouviu uma informação terrível: Esaú estava propondo matar Jacó. Por
causa disso, temendo perder seu filho querido, enviou-o a Padã-Arã, porém
tencionava buscá-lo quando a ira de Esaú diminuísse. No entanto, nunca o fez,
sinalizando um rompimento fraternal grave e duradouro.
Não é sabido se
Rebeca, a serva do Senhor, se arrependeu por ter discriminado o filho mais
velho durante toda a sua vida e mimado o mais novo, ensejando, no fim de tudo,
uma confusão que a afastaria para sempre do seu filho amado Jacó.
A lição
extraída disso tudo é que o ódio plantado na família pode ser incontrolável. O
correto é remover, com urgência, o mal pela raiz, através do perdão. E muito
triste saber que um casal tão abençoado como Isaque e Rebeca tenha errado de
maneira tão decisiva na educação de seus filhos. Fica o exemplo para todas as
famílias da terra. O amor deve ser distribuído profunda e indistintamente entre
os filhos. Caso contrário, a formação deles, inclusive a espiritual, ficará
comprometida.
Dessa forma, é
bem possível que a divisão na família de Isaque tenha cooperado, ainda que
minimamente, em produzir um filho completamente distanciado dos padrões
divinos, como foi Esaú.
III. Fim da História
1. A fuga
Fugir nunca é a
melhor saída. O importante é que cada pessoa assuma seus erros e arque com as
consequências. Jacó, porém, diante do drástico rompimento familiar, empreendeu
uma longa viagem à terra de seus avós maternos. Ele não sabia que lá, distante
dos cuidados de sua mãe, passaria por momentos bastante difíceis. Seu tio Labão
foi um péssimo anfitrião.
Egoísta e
traiçoeiro, Labão fez o sobrinho experimentar dos seus próprios métodos
familiares, com os quais enganara seu pai e seu irmão. Não adiantou reclamar,
pois o irmão de sua mãe mudou seu salário dez vezes, com o objetivo que não
tivesse prosperidade nos negócios. Apesar disso, o Eterno o ajudou e o abençoou
(Gn 31.7,41,42). Entretanto, como toda fuga tem seu fim, chegou o dia
determinado pelo Altíssimo, no qual o fugitivo voltaria à sua terra.
2. O retorno
“Então Jacó
orou: ‘Ó Deus de meu pai Abraão, Deus de meu pai Isaque, ó Senhor que me
disseste: ‘Volte para a sua terra e para os seus parentes e eu o farei
prosperar'” (Gn 32.9 NVI). Jacó estava muito aflito! E por quê? Porque ninguém
pode ser feliz se, no passado, rastros de sofrimento foram deixados sem
solução, se inocentes ficaram no prejuízo e se lágrimas de aflição rolaram sem
consolo. O Senhor pedirá contas um dia. Essa é uma lei inexorável. Imagine
agora como a situação fica mais complicada se isso aconteceu em nome do
Altíssimo? Que drama! Que incongruência! Pois foi exatamente tal circunstância
que se deu na vida do patriarca Jacó. E foi por causa disso que o Senhor
determinou seu retorno à terra de seus pais.
Questões mal
resolvidas são pedras no caminho da felicidade. No texto bíblico agora citado,
há a informação de que o Criador mandou o "usurpador” retornar à “casa de
seus pais e aos seus parentes”. Que grande susto para um fugitivo! O dia de
fazer um “acerto de contas” com o seu passado havia chegado. Ele não poderia
seguir adiante sem isso. Bem, ele até poderia, só que sem a bênção do
Altíssimo.
Jacó, anos
antes, tinha fugido de sua casa, por causa de uma trapaça que fizera. Seu irmão
gêmeo e pai foram enganados. Sua conduta trouxe vexame, dor e lágrimas para sua
família. Ele viajou para uma terra distante, arrumou emprego, casou, ficou
rico, estava aparentemente tudo bem... contudo, havia algo que o amarrava...
Era o ódio pelo seu irmão. O problema é que Jacó tentava empurrar isso para
“debaixo do tapete” da existência. Porém, seria inútil. O filho preferido da
mãe não poderia mais dar legalidade ao inimigo. Ele precisava enfrentar os
dramas causados por suas escolhas egoístas, pois era um fugitivo dos seus
próprios erros. E precisava deixar de ser, pois os foragidos nunca encontrarão
a verdadeira paz. Como escapar de si mesmo? Como escapar da própria consciência
que arde? Há uma lei, um princípio, que proíbe a existência de felicidade plena
se, no passado, maldades foram perpetradas contra pessoas inocentes.
Essa diretriz
da justiça divina está em toda a Bíblia e alcançou a vida do filho pródigo,
narrada por Jesus em Lucas 15 (aquele moço jamais seria feliz se não voltasse
para se reconciliar com seu pai). Um dia, na fazenda em que cuidava dos porcos,
ele, caindo em si, entendeu que o único caminho da felicidade era voltar, para
se reconciliar com seu pai. Do contrário, ele nunca se reencontraria com o
caminho da vida.
A bênção do
Todo-Poderoso somente flui, em sua plenitude, para quem responde pelos
sofrimentos causados intencionalmente, sobretudo aos familiares, de maneira a
evitar que os inimigos do Senhor blasfemem, conforme Natã explicou a Davi (2 Sm
12.14).
Assim sendo,
filhos que abandonaram e praguejaram contra seus pais, ou vice-versa, ou
quaisquer outros relacionamentos que exigiam cumplicidade recíproca diante de
Deus, e que daí adveio traição, só poderão encontrar o caminho da paz quando
restaurarem, pelo perdão, os elos vitais quebrados. Talvez, por enquanto, o
Senhor não esteja exigindo uma conduta objetiva a esse respeito, mas no futuro
o Altíssimo certamente cobrará o retorno, para um reencontro indispensável.
O Excelso
Criador tinha mandado que o avô dos irmãos beligerantes, Abraão, saísse da sua
terra e da sua parentela para uma terra que manasse leite e mel, mas o Senhor
nunca determinou o retorno do pai da fé à sua terra natal. Por quê? Porque a
vida de Abraão, em Ur dos Caldeus, estava bem resolvida familiarmente! Ele não
era foragido, mas partiu de cabeça erguida. Entretanto, seu neto, ao contrário,
tinha deixado marcas de sofrimento na vida do pai e do irmão e, por isso, era
preciso retornar para pagar o débito com o Eterno e com sua família (Gn 32.3),
pois quem assim não procede nunca poderá seguir em frente.
Da mesma forma,
esse princípio divino atuou no caso de Onésimo, o escravo fugitivo de Filemon.
Deus queria que ambos resolvessem a “quebra de fidelidade” que tinha
acontecido. Paulo, por isso, escreveu uma carta ao seu amigo Filemon,
determinando o reencontro. Voltar ao passado é um requisito para ser feliz e
próspero na vida. Onésimo nunca poderia ser um obreiro eficaz com um "mandado
de prisão” contra si. É preciso que todas as amarras sejam soltas.
Interessante,
Deus havia dito a Jacó: “volte... e o farei prosperar.” Farei prosperar? Mas
Jacó já não era rico e tinha muitos filhos? Sim, porém ele não era próspero! Só
a partir daquele reencontro, o Senhor lhe daria a real prosperidade.
Para retornar e
resolver os conflitos do passado, como sempre acontece, um forte medo invadiu o
patriarca. Não seria bom continuar se evadindo? Só que o Eterno não
aceitaria... Ele havia colocado Jacó numa encruzilhada. Sem ter alternativa,
enfrentou o dilema do retorno da maneira que aprendera com seu pai Isaque e seu
avô Abraão: buscando a Deus. Antes de se chegar ao seu irmão, reencontrou-se
com o próprio Criador, em Jaboque, durante toda uma noite, quando seu caráter
foi mudado. Ele deixou de ser “enganador” e foi transformado em Israel, que
significa "aquele que luta com Deus”.
Será que na sua
vida existe alguma relação que precisa ser reatada, principalmente diante do
Todo-Poderoso? Uma má ação praticada contra alguém que amava você? Uma
lembrança triste, a qual você prefere não trazer à memória ou que você prefere
não mencionar? Talvez este seja o seu momento! O Senhor, quando fala assim, o
faz por amor, visando que as coisas voltem à normalidade e que a bênção dEle
seja derramada abundantemente.
3. O reencontro
Vinte anos já
tinham decorrido desde a fuga de Jacó, mas agora ele retorna com tudo que
possuía para se reencontrar com a sua família (Gn 31.17,18). Esaú era uma
sombra no seu passado, uma marca indelével. Diante disso, Jacó enviou
mensageiros para informar a Esaú que ele estava chegando (Gn 32.3-5). O medo da
vingança assombrava o fugitivo patriarca e ficou ainda mais forte quando os
emissários voltaram, pois disseram que Esaú viria ao seu encontro com
quatrocentos homens (Gn 32.6,7). A partir daí, Jacó voltou a tratar diretamente
com aquEle que pode fazer todas as coisas e que aparecera a ele no caminho de
ida (Gn 28.10-13). Ele fez uma vigília a noite inteira e teve um encontro com o
Altíssimo (Gn 32.22-31). Ao amanhecer o dia, Esaú despontou no horizonte com
quatrocentos homens. Era um grande exército para a época! Mas o Senhor se
compadeceu de Jacó e houve reconciliação entre os irmãos. Está escrito: “Então,
Esaú correu-lhe ao encontro e abraçou-o; e lançou-se sobre o seu pescoço e
beijou-o; e choraram” (Gn 33.4). No fim de tudo, Israel (aquele que lutou com
Deus e prevaleceu), com a alma leve, teve um grave entrave do seu passado
resolvido. Só não aconteceu mortandade porque Jacó buscou ao Senhor em tempo
(Os 12.3,4) e se humilhou ante Esaú, recebendo o perdão, podendo, mais uma vez,
sorrir livremente. Nada mais impediria aquele ancestral de Jesus a ser próspero
de verdade, com toda sua família. Glória ao Eterno! O reencontro marcou a
completa reconciliação de irmãos que estavam separados há décadas. A família de
Isaque agora poderia seguir seu caminho. Só o Criador cura graves traumas
familiares.
Tempos depois,
Isaque morreu, e seus descendentes, unidos, sepultaram-no (Gn 35.29). “Nota o
homem sincero e considera o que é reto, porque o futuro desse homem será de
paz” (SI 37.37).
Os descendentes
de Isaque experimentaram as consequências de uma danosa semente de discórdia
plantada pelos próprios pais. Fica o exemplo. É preciso haver equilíbrio no
tratamento dos filhos, confiança no caráter de Deus, que sempre cumpre as suas
promessas, além de um profundo desejo de construir um lar que glorifique ao
Senhor, que faça a diferença na terra. Este é o plano divino para os jovens que
esperam no Senhor!
Autor: Reynaldo Odilo
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